A Missa da Ceia do Senhor, celebrada na noite da Quinta-feira Santa, inaugura o Tríduo Pascal, o coração do ano litúrgico cristão. Essa celebração solene rememora a instituição da Eucaristia e do sacerdócio ministerial por Jesus na Última Ceia, e manifesta, com gestos e símbolos, o mandamento do amor, vivido até a doação total de si mesmo na cruz.
É uma das liturgias mais intensas da Semana Santa, pois une três grandes dimensões da fé cristã: o Sacramento da Eucaristia, o serviço fraterno, e a entrega amorosa de Cristo, que se prepara para sua Paixão e Morte.
Na Última Ceia, Jesus antecipa sacramentalmente o que viverá no Calvário. Ao tomar o pão e o vinho, Ele os transforma em seu Corpo e Sangue, entregues por amor. É o momento em que nasce o Sacramento da Eucaristia, memorial da nova e eterna aliança.
“Enquanto comiam, Jesus tomou o pão, e, tendo pronunciado a bênção, partiu-o e deu aos discípulos, dizendo: ‘Tomai e comei, isto é o meu corpo’. Em seguida, tomou o cálice, deu graças e deu-lhes, dizendo: ‘Bebei dele todos, pois isto é o meu sangue, o sangue da aliança, que é derramado por muitos para remissão dos pecados’” (Mt 26,26-28).
A cada celebração Eucarística, os fiéis atualizam sacramentalmente esse dom, tornando-se participantes do sacrifício redentor de Cristo. A Ceia do Senhor, portanto, não é uma simples recordação, mas uma presença viva do mistério pascal.
Ao dizer aos apóstolos “fazei isto em memória de mim” (Lc 22,19), Jesus os constitui ministros do seu mistério pascal. É nesse contexto que se reconhece a instituição do sacerdócio ministerial, pela qual os presbíteros, em comunhão com o bispo, perpetuam a Eucaristia na vida da Igreja.
O sacerdócio é dom e missão: não para dominar, mas para servir, como o próprio Jesus ensinou.
“Pois eu vos dei o exemplo, para que, como eu vos fiz, assim façais também vós” (Jo 13,15).
Na Missa da Ceia do Senhor, recorda-se com especial gratidão o chamado dos pastores da Igreja, que fazem Cristo presente na Palavra, na Eucaristia e no cuidado com o povo.
Um dos momentos mais significativos da celebração é o rito do lava-pés, em que o celebrante lava os pés de 12 pessoas, à imitação de Jesus, que lavou os pés de seus discípulos.
“Levantou-se da ceia, tirou o manto e, tomando uma toalha, cingiu-se com ela. Depois, derramou água numa bacia e começou a lavar os pés dos discípulos” (Jo 13,4-5).
Esse gesto, profundamente simbólico, mostra que o verdadeiro culto a Deus passa pelo amor concreto ao próximo. Jesus, Mestre e Senhor, se abaixa para servir, e pede que seus discípulos façam o mesmo. O lava-pés nos lembra que a Eucaristia não é isolada da vida: ela nos impele à caridade, à humildade e ao serviço desinteressado.
Após o rito do lava-pés, segue-se a Liturgia Eucarística, com a consagração e a comunhão, momento em que os fiéis participam do corpo e sangue do Senhor. Nessa celebração, a Eucaristia tem uma densidade especial, pois se conecta diretamente ao mistério da Cruz e à entrega total de Cristo por amor à humanidade.
O fim da Missa é marcado por um gesto comovente: o translado do Santíssimo Sacramento para um lugar de adoração. O altar é desnudado, e não há bênção final. Começa, então, o tempo da vigília, em que a Igreja vela com Jesus, como no Getsêmani. É um tempo de oração silenciosa, de intimidade com o Senhor que se prepara para sua paixão:
“Ficai aqui e vigiai comigo” (Mt 26,38).
Neste dia queremos rezar por todos os sacerdotes. Para haver Eucaristia é necessário termos sacerdotes, ou seja, ministros ordenados. Hoje, de maneira especial, devemos rezar por todos os sacerdotes, particulamente, os idosos, doentes, privados do exercício do ministério e,
sobretudo, perseguidos dentro e fora da Igreja. A misericordia deve começar para com o sacerdotes. Não destruir o ministério sacerdotal de quem quer que seja, mas recuperar os sacerdotes que passam dificuldades. A compaixão e a misericordia, que tem como nome o amor fraterno, deve ser para todos!
A Missa da Ceia do Senhor é mais do que uma lembrança de um evento passado. Ela é memorial vivo que atualiza o dom da Eucaristia, o chamado ao serviço e a entrega generosa da vida. É também convite à fidelidade, como aquela que Jesus esperava dos discípulos na hora da sua agonia.
“Tendo amado os seus que estavam no mundo, amou-os até o fim” (Jo 13,1).
Esse amor “até o fim” nos impulsiona a viver a fé de modo coerente, generoso e comprometido. A cada Quinta-feira Santa, a Igreja revive o mistério do amor que se dá no pão partido, no cálice partilhado e no gesto humilde do serviço.
+ Anuar Battisti Arcebispo Emérito de Maringá (PR)
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