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Dom Anuar Batisti
Formado em filosofia no Paraná e em teologia pela Pontifícia Universidade Lateranense de Roma, Dom Anuar Battisti é Arcebispo Emérito de Maringá (PR). Em 15 de abril de 1998, por escolha do papa João Paulo II, foi nomeado bispo diocesano de Toledo, sendo empossado no mesmo dia da ordenação episcopal, em 20 de junho daquele ano. Em 2009 recebeu o título de Doutor Honoris Causa, um dos mais importantes, concedidos pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Em 2007, foi presidente da Comissão para os Ministérios Ordenados e a Vida Sagrada, da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). Em 2015, foi membro do Conselho Administrativo da Pastoral da Criança Internacional e, ainda na CNBB, foi delegado suplente. No Conselho Episcopal Latino-Americano atuou como Presidente do Departamento das Vocações e Ministérios, até 2019.

O Trabalho à Luz da Fé Cristã: Um Dom e uma Missão

 


O dia 1º de maio é celebrado no mundo inteiro como o Dia do Trabalho. Mais do que um simples feriado ou data comemorativa, esta é uma oportunidade para os cristãos refletirem, à luz da fé, sobre o valor humano, espiritual e social do trabalho. Não é por acaso que a Igreja, em sua sabedoria pastoral, escolheu para essa data a memória de São José Operário, não para desviar o foco do trabalhador, mas para apresentar um exemplo vivo de como o trabalho é parte essencial do plano de Deus para a humanidade.

Desde as primeiras páginas da Escritura, o trabalho aparece como vocação humana. No livro do Gênesis, lemos que “o Senhor Deus tomou o homem e o colocou no jardim do Éden, para que o cultivasse e guardasse” (Gn 2,15). Ou seja, antes mesmo do pecado, o trabalho já fazia parte da vida do ser humano como forma de participar da obra criadora de Deus. O trabalho dignifica o homem, permite-lhe desenvolver os dons recebidos do Criador e contribuir para o bem comum.

Contudo, o pecado desfigurou essa dimensão. O suor, a fadiga, a injustiça e a exploração passaram a fazer parte da experiência laboral. Foi por isso que os profetas clamaram por justiça e os pobres trabalhadores confiaram em Deus como seu defensor. A voz profética de Amós, por exemplo, denuncia: “Ai dos que exploram os pobres e esmagam os necessitados da terra” (cf. Am 8,4-6). A justiça social, portanto, está enraizada na tradição bíblica e cristã.

No Novo Testamento, o trabalho não é apenas valorizado, mas também vivido por Jesus e seus discípulos. O próprio Senhor aprendeu e exerceu o ofício de carpinteiro com São José (cf. Mc 6,3). O apóstolo Paulo, além de evangelizar, fazia tendas com as próprias mãos para não ser um peso à comunidade (cf. At 18,3). Em sua carta aos tessalonicenses, ele afirma: “Se alguém não quer trabalhar, também não coma” (2Ts 3,10), sublinhando a dignidade e a responsabilidade que o trabalho traz consigo.

A tradição da Igreja continuou essa valorização. Com a Encíclica Rerum Novarum, do Papa Leão XIII, publicada em 1891, a Igreja passou a intervir explicitamente na defesa dos direitos dos trabalhadores em tempos de revolução industrial e exploração. Essa carta magna da doutrina social

da Igreja reconhece o direito ao trabalho digno, à remuneração justa, à associação sindical e à proteção do Estado aos mais vulneráveis.

Desde então, o Magistério tem reafirmado, em diferentes contextos históricos, que “o trabalho é para o homem, e não o homem para o trabalho” (São João Paulo II, Laborem Exercens, n. 6). O Concílio Ecumênico Vaticano II também declara: “O homem, trabalhando, não apenas transforma o mundo, mas também realiza-se como pessoa, aprende, desenvolve suas qualidades e se torna mais plenamente homem” (Gaudium et Spes, n. 35).

O Papa Francisco, em diversas ocasiões, defendeu o direito ao trabalho como uma questão de dignidade humana. Em sua exortação apostólica Evangelii Gaudium, ele afirma: “O trabalho é uma necessidade, parte do sentido da vida nesta terra, caminho de maturação, de desenvolvimento humano e de realização pessoal” (EG, n. 192). Além disso, critica com firmeza a cultura do descarte que exclui os pobres e desempregados.

Celebrar o Dia do Trabalho, portanto, é também uma celebração da dignidade humana à luz do Evangelho. É tempo de agradecer a Deus pelos dons recebidos, pelos talentos que podemos desenvolver e pelas mãos que trabalham na construção de um mundo mais justo. É igualmente tempo de clamar pelos que estão desempregados, subempregados ou em condições análogas à escravidão, pedindo a intercessão de São José Operário e a sabedoria do Espírito Santo para que haja justiça social e oportunidades dignas para todos.

A missão dos cristãos é dupla: testemunhar no trabalho os valores do Reino — honestidade, solidariedade, generosidade — e lutar, com caridade e coragem, por condições mais humanas de vida e trabalho para todos. Como nos recorda o apóstolo Paulo: “Tudo o que fizerdes, fazei-o de coração, como para o Senhor e não para os homens” (Cl 3,23).

Na minha missão pastoral tenho trabalhado com o mundo da saúde. Quero agradecer a Deus ao trabalho silencioso e eficiente de todos os médicos, administradores hospitalares, enfermeiros e todos os que levam saúde para as pessoas!

Neste 1º de maio, que o Senhor abençoe cada trabalhador e trabalhadora, que proteja os desempregados, e que nos conceda sabedoria

para que nossas ações contribuam para um mundo onde o trabalho seja sinal de dignidade, fraternidade e esperança.

+Anuar Battisti

 Arcebispo Emérito de Maringá (PR)

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