“Inteligência Artificial e Sabedoria do Coração: por uma comunicação plenamente humana”
Todos os anos, a Igreja Católica celebra o Dia Mundial das Comunicações Sociais, instituído pelo Concílio Vaticano II, com o objetivo de promover a reflexão sobre o papel dos meios de comunicação na vida da Igreja e da sociedade. Em 2025, essa celebração chega à sua 59ª edição, e será comemorada no domingo da Ascensão do Senhor, dia 1º de junho. A data é uma ocasião importante para reconhecer o valor da comunicação na construção da verdade, do diálogo, da paz e da evangelização.
O Papa Francisco escolheu como tema para este ano: “Inteligência Artificial e Sabedoria do Coração: por uma comunicação plenamente humana”. Esse tema se insere nas profundas transformações que a sociedade vive no campo tecnológico, especialmente com o crescimento exponencial da inteligência artificial (IA) e sua presença cada vez mais constante em todos os aspectos da vida humana — desde a produção de conteúdos, o trabalho e a educação, até o ambiente religioso e pastoral.
Com esse título, o Papa propõe uma reflexão crítica e esperançosa sobre como as novas tecnologias podem (ou não) contribuir para uma comunicação autêntica, capaz de promover relações humanas verdadeiras, solidárias e compassivas.
O conceito de “sabedoria do coração” é central na mensagem. Para o Papa, comunicar-se verdadeiramente não é apenas transmitir dados ou reproduzir mensagens automatizadas, mas é colocar-se diante do outro com empatia, escuta e responsabilidade. A sabedoria do coração envolve discernimento, ética e o desejo de bem comum.
Francisco alerta sobre os riscos de uma comunicação desumanizada, fria e manipuladora, muitas vezes fomentada por algoritmos que privilegiam a polarização e o sensacionalismo. Por isso, ele chama a atenção para o fato de que, mesmo com ferramentas tecnológicas sofisticadas, a comunicação humana permanece um dom profundamente espiritual e moral, que deve ser exercido com verdade, liberdade e caridade.
A Inteligência Artificial pode ser uma aliada poderosa para a missão da Igreja e da sociedade, quando usada com critérios éticos e voltada para o bem das pessoas. Ela pode, por exemplo, facilitar a tradução de conteúdos religiosos, ampliar o acesso à informação, auxiliar na formação e
evangelização, além de contribuir para a inclusão de pessoas com deficiências.
Por outro lado, o Papa Francisco levanta preocupações legítimas: quem controla as tecnologias? Que valores norteiam as programações e decisões dos sistemas inteligentes? A quem servem os dados que são coletados diariamente? Há riscos reais de manipulação, vigilância e desinformação em larga escala.
Portanto, o chamado do Papa é à responsabilidade ética, à formação crítica de todos — especialmente dos comunicadores, educadores, agentes pastorais, desenvolvedores e líderes — para que a IA esteja a serviço de uma comunicação “plenamente humana”, baseada na dignidade de cada pessoa.
O Dia Mundial das Comunicações é também um convite para que todos — padres, bispos, religiosos, jornalistas, catequistas, influenciadores digitais, leigos engajados — reflitam sobre como estão se comunicando no mundo atual. O Papa tem insistido ao longo de seu pontificado que a missão da comunicação cristã é construir pontes, derrubar muros e anunciar a esperança.
O Evangelho nos ensina que Jesus é o comunicador por excelência. Ele se fazia próximo das pessoas, escutava com atenção, falava com autoridade, mas sempre com misericórdia. A mensagem de Jesus é, ao mesmo tempo, exigente e consoladora, porque vem de um coração que ama profundamente.
Seguindo o exemplo de Cristo, somos chamados a comunicar com sabedoria e verdade, sem fake news, sem agressividade, sem julgamento apressado. A comunicação cristã deve ser instrumento de reconciliação, compreensão e luz para um mundo tão carente de sentido e de esperança.
O 59º Dia Mundial das Comunicações nos coloca diante de uma encruzilhada histórica: ou usamos a inteligência artificial com sabedoria para o bem comum, ou corremos o risco de transformar a comunicação num instrumento de desumanização.
A Igreja nos convida a sermos protagonistas de uma comunicação ética, transparente e profundamente humana. Que saibamos usar todos os meios, inclusive os digitais e tecnológicos, como instrumentos de anúncio da Boa Nova, de promoção da paz e de testemunho da verdade.
Que a sabedoria do coração, iluminada pelo Espírito Santo, guie cada palavra, cada gesto, cada publicação. Que nossas comunicações nas redes, nas mídias e nas conversas diárias sejam expressão de um amor que não se cansa de escutar, acolher e transformar.
+Anuar Battisti Arcebispo Emérito de Maringá (PR)
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