Queridos irmãos e irmãs,
A liturgia deste 26º Domingo do Tempo Comum nos chama com força à coerência da fé. O profeta Amós abre nossa reflexão denunciando a complacência dos que vivem no conforto e se esquecem da justiça. Ele diz: “Ai dos que vivem despreocupados em Sião, deitados em leitos de marfim, banqueteando-se com cordeiros do rebanho e bezerros do estábulo” (Am 6,1.4). O problema não está apenas em ter bens, mas em fechar os olhos diante do sofrimento do irmão. É a denúncia de uma vida que se refugia no luxo e se torna cega à dor do próximo.
O salmo de hoje nos convida a colocar nossa confiança somente em Deus: “Não ponhais vossa fé nos poderosos, num homem que não pode salvar” (Sl 145,3). Ele nos recorda que apenas o Senhor é fiel para sempre, defende o oprimido, dá pão aos famintos, liberta os cativos e sustenta o órfão e a viúva. É exatamente essa imagem do Deus da justiça e da compaixão que ilumina a parábola do Evangelho: enquanto o rico fechou os olhos para Lázaro, Deus se volta para os pobres e necessitados. Ao rezarmos este salmo, reconhecemos que o Senhor é aquele que “abre os olhos aos cegos e ama os justos” (Sl 145,7-8), e pedimos a graça de viver segundo esse mesmo olhar de misericórdia.
Na segunda leitura, São Paulo exorta Timóteo e, com ele, todos nós: “Tu, homem de Deus, foge das coisas perversas, procura a justiça, a piedade, a fé, o amor, a firmeza, a mansidão. Combate o bom combate da fé, conquista a vida eterna” (1Tm 6,11-12). A vida cristã não é passividade; exige esforço, decisão, perseverança. Nossa vocação é viver com integridade, testemunhando a fé em meio às tentações de comodidade e egoísmo. Paulo nos lembra que temos um horizonte: a manifestação gloriosa de Cristo, o único Senhor, “o Rei dos reis e Senhor dos senhores, o único que possui a imortalidade e habita uma luz inacessível” (1Tm 6,15-16).
O Evangelho de Lucas nos apresenta a parábola do rico e de Lázaro (Lc 16,19-31). Jesus fala de um homem rico que se vestia de púrpura e linho finíssimo e fazia festas esplêndidas todos os dias, enquanto à sua porta jazia um pobre chamado Lázaro, coberto de feridas, que desejava matar a fome com as sobras que caíam da mesa do rico. Quando ambos morreram, Lázaro foi levado pelos anjos para junto de Abraão, e o rico foi sepultado e se encontrou em tormento. Do abismo do sofrimento, o rico pede socorro e
ainda suplica que Lázaro vá avisar seus irmãos. Mas Abraão responde: “Eles têm Moisés e os profetas: que os escutem!… Se não escutam a Moisés nem aos profetas, mesmo que alguém ressuscite dos mortos, não acreditarão” (Lc 16,29.31).
A parábola não condena simplesmente a riqueza, mas a omissão e a indiferença. O pecado do rico foi viver fechado em si mesmo, incapaz de ver o pobre à sua porta. É o julgamento da omissão, da falta de compaixão. O Evangelho nos mostra que a Palavra de Deus — Moisés, os profetas e agora Cristo — já nos foi dada como guia. Se não a escutarmos, não será nenhum milagre que nos converterá.
Hoje somos convidados a abrir os olhos e o coração. Quantos “Lázaros” estão à nossa porta! Pobres, doentes, abandonados, famintos, pessoas sem dignidade. Não basta dizer que não fazemos mal a ninguém; o Evangelho exige um amor ativo, uma solidariedade concreta, a coragem de repartir e de estender a mão. O chamado de São Paulo ressoa: “Combate o bom combate da fé” (1Tm 6,12). E a voz de Amós nos desperta: “Ai dos que vivem despreocupados” (Am 6,1).
Queridos irmãos, o Senhor hoje nos pede vigilância. Não sabemos o dia nem a hora em que seremos chamados, mas sabemos que a vida presente é o tempo favorável para amar. Que o nosso coração não se feche como o do rico da parábola, mas se abra como o coração de Cristo, que se fez pobre para nos enriquecer com a sua graça.
Peçamos a Deus que nos conceda um coração sensível e atento, capaz de ouvir a sua Palavra e praticá-la. E que Nossa Senhora, Mãe dos pobres e consoladora dos aflitos, nos ensine a ser discípulos missionários que vivem a fé não em palavras, mas em gestos de amor.
Amém.
+Anuar Battisti Arcebispo Emérito de Maringá (PR)
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