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Dom Anuar Batisti
Formado em filosofia no Paraná e em teologia pela Pontifícia Universidade Lateranense de Roma, Dom Anuar Battisti é Arcebispo Emérito de Maringá (PR). Em 15 de abril de 1998, por escolha do papa João Paulo II, foi nomeado bispo diocesano de Toledo, sendo empossado no mesmo dia da ordenação episcopal, em 20 de junho daquele ano. Em 2009 recebeu o título de Doutor Honoris Causa, um dos mais importantes, concedidos pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Em 2007, foi presidente da Comissão para os Ministérios Ordenados e a Vida Sagrada, da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). Em 2015, foi membro do Conselho Administrativo da Pastoral da Criança Internacional e, ainda na CNBB, foi delegado suplente. No Conselho Episcopal Latino-Americano atuou como Presidente do Departamento das Vocações e Ministérios, até 2019.

Homilia – 27º Domingo do Tempo Comum – Ano C

Queridos irmãos e irmãs,

Neste 27º Domingo do Tempo Comum, a Liturgia da Palavra nos coloca diante de um pedido que deve ser também o nosso: “Senhor, aumenta a nossa fé!” (Lc 17,5). Esse clamor dos apóstolos resume bem a experiência humana: diante das dificuldades da vida, da violência do mundo e até mesmo de nossas próprias limitações, percebemos como nossa fé é pequena. E, no entanto, é justamente esta fé — dom recebido de Deus — que nos sustenta, que nos dá vida, que nos permite caminhar no meio das trevas.

A primeira leitura, tirada do profeta Habacuc, parece escrita para os nossos dias. Ele se volta para Deus em súplica: “Até quando, Senhor, clamarei, sem que me ouças? Gritarei a ti: ‘Violência!’, sem que me salves?” (Hab 1,2). Quantos de nós também levantamos essa pergunta diante das notícias de guerras, da violência nas cidades, da corrupção, do desprezo pelos pobres e indefesos! É a pergunta do justo que sofre. Mas a resposta de Deus é firme: “O justo viverá pela sua fé” (Hab 2,4). Não é pelo poder, pela força ou pela esperteza que se vence o mal, mas pela fé que permanece fiel em meio às provações.

O Salmo 94 retoma essa mesma ideia, dizendo: “Oxalá ouvísseis hoje a sua voz: não fecheis os vossos corações” (Sl 94,7-8). A fé é, antes de tudo, abrir o coração para escutar a voz do Senhor, mesmo quando essa voz nos pede perseverança no deserto, como aconteceu com Israel. O povo no deserto fechou o coração e duvidou, mas o salmo nos chama a confiar: “Vinde, adoremos e prostremo-nos em terra, e ajoelhemos diante do Deus que nos criou” (Sl 94,6).

São Paulo, em sua segunda carta a Timóteo – 2Tm 1,6-8.13-14 –, retoma esse convite à confiança. Ele lembra a seu discípulo: “Exorto-te a reavivar o dom de Deus que recebeste pela imposição de minhas mãos” (2Tm 1,6). Esse dom é a fé, o Espírito Santo que habita em nós desde o batismo e que precisa ser constantemente reavivado. E Paulo acrescenta algo fundamental: “Deus não nos deu um espírito de covardia, mas de fortaleza, de amor e de sabedoria” (2Tm 1,7). Quantas vezes, diante das dificuldades, pensamos que nossa fé é frágil, que não daremos conta! Mas a

Palavra hoje nos recorda que o Espírito que recebemos não é de medo, mas de coragem e amor.

No Evangelho, os apóstolos pedem: “Senhor, aumenta a nossa fé!” (Lc 17,5). E Jesus responde com uma imagem surpreendente: “Se tivésseis fé, mesmo pequena como um grão de mostarda, diríeis a esta amoreira: ‘Arranca-te daqui e planta-te no mar’, e ela vos obedeceria” (Lc 17,6). O grão de mostarda é pequeno, quase imperceptível, mas vivo. Assim é a fé verdadeira: talvez pequena aos olhos humanos, mas cheia de vida e enraizada em Deus, capaz de mover o impossível.

Mas Jesus vai além. Ele conta a parábola do servo que, depois de ter feito o que devia, não exige reconhecimento, mas apenas cumpre o seu dever. E conclui: “Assim também vós, quando tiverdes feito tudo o que vos mandaram, dizei: ‘Somos servos inúteis; fizemos o que devíamos fazer’” (Lc 17,10). Essa palavra é um grande antídoto contra o orgulho e a tentação de achar que merecemos recompensas diante de Deus. Na verdade, tudo é graça. Servir ao Senhor e aos irmãos já é, por si só, a nossa recompensa.

Queridos irmãos e irmãs, o mundo de hoje nos convida constantemente ao contrário: à busca de prestígio, poder, aplausos, vaidade. Mas o Evangelho nos recorda que o verdadeiro discípulo é aquele que serve sem esperar nada em troca. A fé nos coloca na verdade de que Deus é tudo, e nós somos apenas instrumentos. O amado e prudente Papa Leão XIV nos recorda em suas catequeses recentes que a fé verdadeira é humilde, perseverante e profundamente ligada ao amor que se expressa em obras concretas de serviço.

Diante dessa Palavra, somos chamados a três atitudes neste domingo:

1. Reavivar a fé, mesmo pequena, mas viva, confiando que Deus age no silêncio da história.

2. Escutar a voz do Senhor, sem fechar o coração, mesmo quando as provações parecem longas.

3. Servir com humildade, lembrando que tudo o que temos e fazemos é dom da graça de Deus.

Somos chamados a viver intensamente este mês das missões e do rosário. Somos todos missionários e devemos anunciar a esperança cristã a todos os homens e mulheres de boa vontade! Anunciemos Cristo e o seu Evangelho a todos e em todas as circunstâncias.

Por isso, irmãos, rezemos juntos como os apóstolos: “Senhor, aumenta a nossa fé!”. Que ela, mesmo pequena como o grão de mostarda, seja viva e verdadeira. Que nossa vida seja marcada não pela busca de glória, mas pelo serviço humilde. E que, firmes na fé, possamos atravessar as tribulações da história, certos de que “o justo viverá pela fé” (Hab 2,4). Amém.

+ Anuar Battisti Arcebispo Emérito de Maringá (PR)

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